A Câmara dos Deputados aprovou, na noite desta terça-feira, um projeto que impõe uma das maiores derrotas recentes às companhias aéreas no Brasil. Os parlamentares decidiram proibir a cobrança de bagagem de mão em voos domésticos, restabelecer o direito à mala despachada gratuita e acabar com as tarifas para a marcação de assentos. A decisão representa uma resposta direta às reclamações dos consumidores e reacende o debate sobre o custo das passagens aéreas.
O Projeto de Lei 5041/25, de autoria do deputado Da Vitória (PP-ES), previa originalmente apenas a regulamentação da bagagem de mão. No entanto, o texto foi ampliado pelos parlamentares durante a votação, incluindo uma série de medidas adicionais que impactam diretamente o setor aéreo. Agora, a proposta segue para análise no Senado.

Recado claro às companhias aéreas
Durante a sessão, o presidente da Câmara, Hugo Motta, afirmou que o projeto é uma mensagem contundente às empresas do setor. “Quando surge uma ideia das companhias, que praticamente exercem um oligopólio, para gerar receita extra com a cobrança da bagagem de mão, esta Casa dá um recado claro”, declarou o parlamentar. Segundo Motta, os brasileiros “não aguentam mais pagar tão caro pelas passagens aéreas”.
A decisão da Câmara ocorre em um momento de forte insatisfação popular com os preços dos bilhetes e com as cobranças adicionais que se tornaram comuns nas últimas décadas. A medida foi vista como uma tentativa de reequilibrar a relação entre consumidores e companhias, que frequentemente justificam as taxas extras com o argumento de que elas permitiriam reduzir os custos das passagens — algo que, na prática, não se concretizou.
Proibição da Cobrança da Bagagem de Mão
O ponto central do projeto aprovado é a proibição da cobrança da bagagem de mão em voos domésticos. O texto original também previa a extensão da regra a viagens internacionais, mas o relator Neto Carletto (Avante-BA) manteve a possibilidade de cobrança nos voos para o exterior, alegando a necessidade de preservar a competitividade das companhias de baixo custo.
Com a nova regulamentação, cada passageiro terá o direito de levar uma mala de até 12 kg na cabine, além de um item pessoal, como bolsa ou mochila. As regras serão incorporadas ao Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA), que passará a prever de forma explícita os direitos dos viajantes. A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), atualmente, permite bagagem de até 10 kg, mas deixa as dimensões sob responsabilidade das companhias.
Prática da cobrança gerou indignação
A cobrança pela bagagem de mão ganhou destaque quando a Gol passou a adotar a prática em outubro, aplicando-a em voos internacionais e em rotas específicas como Rio de Janeiro–Montevidéu. A Latam também realiza a cobrança em alguns trechos internacionais desde o ano passado, enquanto a Azul ainda mantém a gratuidade. A repercussão negativa foi imediata e levou o tema ao centro do debate legislativo.
Além disso, o projeto estabelece que, caso a bagagem de mão não possa ser acomodada na cabine por falta de espaço, o despacho gratuito se tornará obrigatório. Essa medida busca evitar abusos e desconfortos que se tornaram frequentes nos aeroportos.
Senado Também Aprova Regras para Bagagem de Mão
O tema da bagagem de mão também avançou no Senado Federal. A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) aprovou recentemente o Projeto de Lei 120/2020, que assegura o transporte gratuito de até 10 kg de bagagem com dimensões padronizadas. O texto foi encaminhado à Câmara e complementa a discussão sobre o tema.
Segundo a proposta, considera-se bagagem de mão aquela transportada no compartimento superior da cabine, sob a responsabilidade do passageiro, com dimensões de 55 cm x 35 cm x 25 cm. A intenção é uniformizar os critérios entre as companhias, evitando confusões e cobranças indevidas.
Volta da Bagagem Despachada Gratuita
Uma das maiores mudanças introduzidas pela Câmara é o retorno da gratuidade para o despacho de uma mala de até 23 kg em voos nacionais e internacionais. A emenda, de autoria do deputado Alex Manente (Cidadania-SP), retoma um direito eliminado em 2018, quando as companhias passaram a cobrar pelo serviço sob o argumento de reduzir o preço das passagens.
A medida é uma vitória simbólica para os consumidores e uma derrota significativa para o setor aéreo, que viu nas tarifas adicionais uma fonte importante de receita. Órgãos de defesa do consumidor já vinham apontando que a cobrança não trouxe benefícios ao público, mas sim lucros expressivos às empresas.
Fim da Cobrança pela Marcação de Assentos
O projeto também proíbe a cobrança pela marcação de assentos padrão em voos domésticos e internacionais. A proposta, apresentada pelo deputado Otto Alencar Filho (PSD-BA), assegura que o passageiro poderá escolher o assento gratuitamente desde a compra da passagem até o momento do check-in.
Atualmente, companhias como Gol e Latam cobram pela marcação antecipada em todos os momentos do processo de compra, enquanto a Azul oferece um curto período de 24 horas de gratuidade antes do embarque. A mudança, portanto, representa uma adequação às práticas internacionais de maior transparência no serviço aéreo.
Lucro Bilionário das Companhias com Tarifas Extras
Dados da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) mostram que, somente em 2024, as companhias Azul, Gol e Latam arrecadaram R$ 1,9 bilhão com as cobranças de bagagens e marcações de assento. Deste total, R$ 1,1 bilhão vieram das tarifas sobre bagagens, e R$ 860 milhões da marcação de assentos — os maiores valores desde o início da série histórica da agência, em 2015.
Os números reforçam a percepção de que as taxas se tornaram uma fonte estável de lucro para o setor, contrariando a justificativa inicial de baratear os custos aos passageiros. A aprovação do projeto pela Câmara, portanto, busca reverter esse cenário de desequilíbrio entre direitos e arrecadação.
Novas Regras e Medidas Adicionais
O pacote de mudanças não se limitou à bagagem e assentos. Uma emenda da deputada Renata Abreu (Podemos-SP) incluiu no texto a proibição de cancelamento do trecho de volta da passagem caso o passageiro não embarque no voo de ida, salvo autorização expressa — o chamado “no show”.
Além disso, o texto aprovado prevê assistência especial a passageiros com necessidades específicas. As companhias serão obrigadas a fornecer, sem custo adicional, até dois assentos extras quando forem necessários para a acomodação segura do viajante, medida que beneficia pessoas com deficiência e mobilidade reduzida.
Regras Mais Rígidas para Passageiros Indisciplinados
Por outro lado, o projeto também traz uma vitória pontual para as empresas. O Código Brasileiro de Aeronáutica será alterado para permitir que companhias aéreas recusem o transporte, por até 12 meses, de passageiros que cometam atos graves de indisciplina a bordo.
Além disso, as empresas deverão compartilhar entre si os dados de identificação dos passageiros penalizados, garantindo que a sanção tenha efeito em todo o setor. A medida busca coibir comportamentos violentos e agressivos que vêm se tornando mais frequentes nos voos comerciais.
